quinta-feira, junho 09, 2005

Texto que fiz para participar neste desafio. Só depois é que reparei que o limite eram 100 palavras. Portanto, aqui fica o texto completo.


Branco


A página em branco. A folha em branco. A blank sheet.
Quero escrever coisas que perdurem, inolvidáveis, ou dessa aparência. Desejo que aquilo que eu escrevo seja lembrado. Mas, hoje, lendo textos inesquecíveis de autores inesquecíveis, deparo-me com a minha inépcia para pensar num tema e falar sobre ele.
A folha em branco é predadora. Um leão que, sob a cobertura da vegetação, se aproxima, passo a passo, das minhas crias – as palavras – e as come, uma a uma, antes que eu dê por isso, antes que consiga fugir e pô-las a salvo – talvez num terreno alto e sem plantas, deserto, onde eu e outros possam ver claramente a aproximação furtiva do predador.
Quero escrever e não tenho objecto. Não é justo.
Passo em revista as muitas histórias que alguma vez imaginei. Em nenhuma delas o “branco” se inclui. Branco de quê? De mar? De sol? De convés? De terrorista de arma na mão, fazendo reféns num cruzeiro de luxo?
Não existem uzis brancas.
Ou talvez sim. Desconheço o que se considera “fashion” hoje em dia.
O que é branco além da folha carnívora?
As paredes, interiores, exteriores; a luz, quando nos apanha de frente, sobretudo ao guiar. Cerra-se os olhos, mas aquele luminoso branco permeia as pálpebras como água, luz líquida.
Pedras brancas.
Pombas.
Paz. A Paz é branca.

A folha em branco é um predador carnívoro.
E as palavras são carne.
Carne. Crua. De cruel, de crueza.

Sem comentários: