quinta-feira, outubro 13, 2005

Interior


Caminha na estrada rugosa, sem sentimentos. Sem movimento interior ou com todo o movimento interior possível. Atordoada. Hoje, a magia. Hoje a magia está na rua. A magia não lhe sai das mãos, há que buscá-la lá fora, na rua, escavá-la da terra, bebê-la da chuva, senti-la creeping in into her bones. O sono libertou-a durante a noite. Na vigília é necessário reconquistar tudo. Menos a vida. Vida há ali em abundância. A morte não existe e essa é a grande falha. Com a magia virão os sentimentos.

Ela, a caminhante, tem uma alma venturosa e inveja o sangue martirizado dos outros; inveja o grito das gaivotas ao pé do mar porque sentem o cheiro da maresia. Gostava de ter janelas para poder ver o oceano. Talvez as construa com o movimento das mãos e a imaginação logo que recupere o que o sono libertou.

Ao fundo da rua, na grande poça de água deixada pela chuva, mergulha os braços e retira um molho feito de feixes entrecruzados, pedras e poeira e enfia-o na carne do ombro. Pronto, já está, pensa. Chateia ter de repetir o ritual todo o santo dia, mas não tem força para manter a magia durante a noite. É demasiado desprendida, urge-a o sentimento da liberdade adiada. Contempla palavras como “liberdade” e pergunta-se “Quando?”. É por isso que o feixe de pedras, paus e pó se vai embora: não encontra força na receptora para o manter fixo, costurado à carne.

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