A 20 de Junho'06 mandei para a Círculo de Leitores (depois de perguntar se podia e dizerem que sim) o último livro que escrevi. Veio recusado a 7 de Julho'06.
"(...) todos os projectos que nos são dirigidos são analisados pelo nosso Conselho de Leitura", diz a carta.
Lamentam informar que não é possível publicar a obra.
Mas não me é dito directamente que foi recusada pelo tal Conselho de Leitura (CL).
Eu gostava de ter mais informações. Quem é este CL? É formado por quem? Pode ser subornado? Chantageado? Será que, com o incentivo próprio, conseguirei que o Dr. House exerça a chantagem em meu nome? (Eu queria.)
O estranho é que eu não estou Lixada (como é costume, o orgulho ferido leonino a ressentir-se), nem triste. Estou um bocadinho triste, mas não o habitual.
Talvez tenha amadurecido.
(Ok, parem de rir.)
Estou é curiosa. O que eu faço, quando tenho a boa-venturança de ver os manuscritos devolvidos - coisa rara -, é folheá-los e cheirá-los para ver se apanho notas à margem (quase nunca) ou o odor de quem o leu (de vez em quando há o leve hálito a tabaco).
Neste não há nada. Veio puro como partiu, se fosse viagem de núpcias podia pedir a anulação do casamento.
Mas eu gostava de saber. O que é que eu fiz de errado?
Porque é que não o podem publicar? Quais foram os critérios para a recusa? Digam-mo, por favor, para da próxima vez não cometer o mesmo erro. Se eu ao menos tivesse uma ideia dos critérios - podia, ao escrever o próximo livro, escrevê-lo tendo em conta essa ideia, essas balizas... místicas, porque nebulosas, porque invisíveis. Porque imateriais (para mim, que não as vejo).
Com a materialidade eu consigo trabalhar. Digam-me as coisas claramente e eu trabalho nesse sentido.
Não estou lixada, não estou triste - estou confusa.
Pode parecer que estou zangada por causa do uso do sarcasmo, que costuma ser a minha reacção defensiva. Daqui a pouco vou usá-lo, mas por outro motivo, não para expressar raiva (que não tenho, a sério. E aproveitem que isto não é normal, hoje sou um leão em coma, um escorpião adormecido), mas para rir um bocadinho: de mim própria, da situação, e porque é melhor rir do que chorar. É mais divertido, ao menos.
Reitero: este texto brota da minha confusão e da tentativa de clarificar ideias, de tentar compreender.
Será que alguém leu sequer o meu livro? Ou leram apenas a sinopse que foi na carta de apresentação?
Está o CL reunido umas tantas horas semanais, mergulhado até às orelhas em manuscritos e cada um só tem direito a três minutos de atenção?
Como é a dinâmica da coisa?
Como é que aquilo funciona?
Será que o CL existe?
Ou é apenas uma mentira propagada há décadas pelas editoras de Portugal e do Mundo?
Porque é que as recusas não têm mais... substância? Tipo, não indo ponto por ponto, analisando o livro, mas ao menos dando uma ideia geral do que está "errado" ou "certo", ou, para ser mais explícita, do que funciona ou não em termos de mercado.
Porque é que foi recusado?
Motivos literários ou comerciais?
Gostava de saber se escrevo merda que não vai vender; merda que vai vender; ou algo de jeito que não vai vender (assim ao menos saberia o que mudar).
Sou demasiado literária e pouco comercial ou o inverso? Ou má em ambas as categorias?
Percebo que os editores não podem andar a gastar o (seu) dinheiro em tudo o que lhes aparece à frente. Afinal, estou a pedir-lhes que gastem o Dinheiro Deles em algo meu. Se não há depois nem retorno do investimento nem lucro, não os posso causticar por se precaverem, não é?
Mas digam-me claramente o que procuram para eu não andar às aranhas.
Gostava de saber também se há escritores que têm direito a cartas com as recusas explicadas e fundamentadas ou se é standard para toda a gente.
Como serão as cartas de recusa do Saramago? Deve tê-las, ao menos as antigas, com certeza, a não ser que tenha feito como eu e as tenha queimado na Salamandra (estava frio). Esta vai iniciar a nova colecção de negativas. Espero que compreenda a honra.
Bom, se calhar o que eu vou fazer é mandar um mail à Círculo de Leitores e perguntar, com todo o respeito, se me podem dizer as razões da recusa.
(Se calhar, ainda não sei...)
Quanto ao Conselho de Leitura, tenho a mente permeada de dúvidas, como um barquinho a remos perfurado, só no meio do oceano.
Onde se reúnem? Haverá um local secreto cuja localização só pode ser conhecida após um doloroso ritual de iniciação? Algo assim à maneira dos Boinas Verdes?
Será que dançam ao luar?
Nus?
Ou de tanga?
Será que gritam palavras de Poder para facilitarem o Alinhamento com o Universo, o Todo, o Espírito Superior?
Será que comem bolachinhas nos intervalos? Ó, eu sei fazer bolachinhas. E doces. Pudins, tortas de laranja, bolos de chocolate, é darem-me a receita que prontamente confecciono a iguaria.
Vá lá, venham a minha casa: eu tenho bolachinhas e compro vinho do Porto.
Ou xerez.
Venham dançar nus para a minha sala, cobertos de pinturas ritualistas (azuis, por algum motivo penso que devem ser azuis), a saltarem, a uivarem à lua como os lobos, segurando manuscritos e rodando em torno da fogueira (eu parto uma cadeira ou duas para o lume), enquanto aguardam que o Universo vos Ilumine na escolha da obra a ser publicada.
É assim que funciona?
Têm de me dizer senão começo a pensar estas parvoíces.
Entro em paranóias.
Será que tomam banhos cerimoniais antes de se reunirem? E arrancam todos os pelinhos do corpo como os antigos sacerdotes egípcios?
Ou sacrificam criancinhas aos Deuses Editoriais?
Bebem o seu sangue?
Ou é engarrafado e vendido na Ebay para compensar as más escolhas editoriais?
Por acaso tocam tambores quando dançam em pêlo à volta do fogo?
Nunca vos apareceu por lá uma escola de samba a dançar? E se calhar tiveram de os deter e informar, sérios:
- Meus amigos, desculpem, mas isto é uma reunião de trabalho.
Epá, contem-me como é: dunyazade@gmail.com
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