segunda-feira, março 31, 2003

::Não sejas parvo, rapaz::

Para quê (para quê, para quê) tudo isto
se ando a ler Somerset Maugham e
compreendo tudo, tudo?
(O anavalhado livro está no fio...)
(Que óptima ideia - a biblioteca!)
Não sejas parvo, rapaz, há mais coisas além do céu, tantas que nem
Shakespeare (o que abana a espada) soube contar (enumerar, discriminar).
Ontem, perto do sopé da montanha, desceu-me um duende ao ouvido e disse:
"Ás vezes sei de coisas que nem sei como soube delas."
Espantei-me magnificamente. Os duendes nascem do céu! E têm questões filosóficas consigo! Os duendes, por Deus, os duendes!
E, por aqui, como vão as gentes absolutamente terrealizadas?
Vão desrealizando desrealizando-se na vida que se vive vivida.
O soberano e muy acumulado bom senso reina.
(Acumulamos coisas, não nos acumulamos a nós próprios, já repararam?)
Não sejas parvo, rapaz, não sejas parvo.
Há que realizar a total desrealização, proferem.
(Doce, doce inanidade...)
(Ando a ler o enchanted Heyst do Conrad... interessante, gosto.)
Gosto.
(O tipo é um barão sueco cavalheiro até à medula.)
(E depois há o Schomberg, a singular besta.)
Enfim, não se fale mais de mim.
Cale-se cale-se no morno mar a histeria do fim.
Que imbecilidade rapaz, a ler Conrad?!
O duende trambolhou montanha abaixo - um género de desporto radical - e num discreto sussurro disse:
"Às vezes sei de palavras que nem sei como soube delas.
Vêm-me, etéreas, poisar nas mãos porque as conservo
nuas, vazias e limpas."
(E 'tás praí especado a observar a folha branca e não compreendes que já acabou?)
(Vai-te embora. É fecho de emissão.)
Fechou.

1/2000


(E aqui fica mais um poema, antigo, porque a poesia não se achega a mim já há bastante tempo.)

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