Filhos da puta dos gobelins. Eu sei lá o que são gobelins! Sou classe média, porra! Neta de agricultores analfabetos! Eu lá sei o que são gobelins...
Perguntem-me sobre sardinha assada, frango no churrasco, vivendas com empenas inclinadas na santa terrinha, onde nunca neva. Nunca vi um cabrão de um floco de neve perdido, a pedir indicações para regressar à Suiça ou à França. Falem-me de azulejos na parte exterior das casas e eu compreendo. Agora gobelins?! Digam-me que foram aos saldos ou comprar roupa na Feira das Galinheiras – vou perceber. Aliás, como não perceber a existência de móveis onde nas vitrinas se ostentam copos de cristal? Quem tem gobelins não terá móveis destes, expondo copos de champanhe de cristal, comprados nas franças, décadas atrás. Ca-te-go-ri-a. Ah! (Estalinho de boca.) Repetição: ca-te-go-ri-a! Ah-ah! Carro que é carro só de Mercedes para cima, não importa o ano, se é a gasolina ou gasóleo, tem de ser é Mercedes! Ah não! Ora pois! Eu percebo isso tudo. Percebo que o mês de Agosto é o mais importante para os meus primos e tios franceses. Percebo que se casem e baptizem só em Agosto. Percebo que é o mês de praia e sol, ansiado o ano inteiro, lá, onde só chove e chove e uma nesga de luz é milagre gerador de comentários semanas a fio. O que é que sei de gobelins, chiça?! Ora se não fosse a internet bem podia morrer burra! (Ou quase: bem-hajam as bibliotecas.) Nem tenho quadros em casa. Nem serigrafias. Já passei o tempo dos posters de bandas pop-rock e artistas celebérrimos. O último poster, lembro, a ser despejado da parede do meu quarto foi o de Brad Pitt. Porra, o tipo é bom. Todos os dias. Mas gobelins...? Gobelins...?
Como viverá uma família que os possua? Que os tenha há décadas? Ou séculos, se é possível. Até entendo, obliquamente, o possuir-se um quadro do Cargaleiro, assim, a modos que desgarrado na sala, a pontificar por entre a quinquilharia de bibelôs e pratos representando a Natividade. Um – eu percebo. Quem é que na classe média lusa pode coleccionar quadros? Quem é que andará de galeria em galeria comprando esta e aquela tela, porque lhe agrada? (Não falo, óbvio, dos pintores famosos, mas dos outros, mais baratuchos, com toneladas da talento.) Qual é o pai de família, bigodudo, sócio do Benfica, faz piqueniques aos Domingos ou passeia com mulher e filhos no Centro Comercial, taxista, quiçá; qual é o pai de família, repito, que colecciona quadros de pintores contemporâneos? Que faz o circuito das galerias, à cata de belas obras, que lhe agradem e sejam baratas o suficiente para ele as comprar? Conhecem algum? Se sim, rápido, dêem-me os contactos da criatura, dessa ave rara! Perguntem a um funcionário público:
- Tem gobelins em casa?
A resposta seria:
- Sim, mas já os tomei todos. Tenho de ir ao médico de família renovar a receita. Isto com a saúde não se brinca! (Frémito vivaz do bigode.)
Como é que eu, vil criatura, nada e criada na classe média, me concedo o atrevimento de falar, ainda que pela rama, sobre gobelins! Gobelins, por Deus, gobelins!
Mas falo. Não é a ignorância que me atrapalha. Quem se atrapalha com a ignorância tem o impedimento da vida.
Espalho-me, de trombas, caio no chão. Não fá mal!
(Ai tanta exclamação, vê-me isso ‘pariga, corta na cafeína.)
Agora vou fazer uma coisa muito feia: não digo o que são gobelins. Façam aqui como a je – vão ao Google.
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