quarta-feira, abril 09, 2003

"- Há anjos – disse Julie. – Às vezes há anjos que nos alegram nos dias mais escuros.
Tinha uma teoria. A Julie não era de teorias, de vez em quando lá esgalhava uma.
Os anjos (disse) fazem-nos voltar os olhos para algum pequeno milagre, um pássaro diferente que repousa na erva a dois metros de ti e não te mexes por teres medo que o encanto se quebre e ele fuja a voar. E é quando mais triste te sentes que o vês, esse quase invisível milagre, depois sentes-te bem o resto do dia. E muitas vezes te lembras, regressas à cena, e um sorriso aflora-te ao rosto.
Estás de mal com o mundo (disse Julie), acordaste com os pés de fora, um mau humor danado, ou em baixo, deprimido, quando, incrivelmente, te sucedem pequenas alegrias no decorrer do dia: compras o último exemplar do jornal, dás o troco exacto e a senhora da papelaria brinda-te com um sorriso rasgado; não tens de esperar em bichas, há sempre um lugar livre e é o teu preferido, ao pé da janela; faz sol quando durante dias não parava de chover; no café há aquele bolo, que adoras, e acabou de chegar, está quente, morninho. Pequenos milagres sucessivos que te exultam e fazem perdoar o mundo.
- São anjos, - acrescentou Julie – só podem ser, que nos fazem isto. Uma vez..."

(Excerto.)

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