(11 de Agosto de 2009)
O Louco nas suas andanças encontrou meio enterrado no chão um enorme escudo de ouro falante, que o abordou assim:
- Bom amigo: desenterra-me e leva-me contigo. Mostrar-te-ei grandes tesouros!
Não te fies, disse o cão num breve latido desconfiado.
O Louco respondeu:
- Para que é que eu quero ouro se a natureza sempre me dá aquilo que eu preciso? - e com isto começou a afastar-se.
- Espera! - gritou o Ás de Ouros assustado por vê-lo partir. - Mostro-te mil maravilhas! Mistérios desconhecidos de todos! Só tens que me levar!
O Louco parou e voltou para trás.
- De verdade?
O cão ganiu, destroçado pela sua tolice. Vai levá-lo! Este peso! Vai suar as estopinhas por nada!
- De verdade! - disse o Ás de Ouros sorrindo.
O Louco acabou de o desenterrar e colocou-o com muito esforço sobre as suas costas.
As horas seguintes foram as mais excruciantes da sua vida. A cada passo o peso parecia esmagá-lo, mas o Ás de Ouros continuamente o incitava, dizendo que além do monte estariam as maravilhas de que falava - mas o monte vinha e afinal não era esse, mas outro perto, um pouco mais além. E as maravilhas nunca vinham.
- Pessoas que crescem nas árvores como frutos! - exclamava o Ás de Ouros. - Sereias aladas com rabos de peixe!
Isto fazia com que o Louco andasse mais depressa e com maior vigor, ainda que se derretesse em suor pois o sol ia alto e estavam no pino do Verão. Ao fim da tarde não pararam para beber água, apesar dos latidos desesperados do cão branco (que só a ia alcançar com a ajuda do Louco, tão fraco de forças se encontrava).
O Ás de Ouro mal sentiu o Louco abrandar o passo, gritou esganiçado:
- Não! Que fazes! É já ali atrás daquela pedra, a melhor água que vais querer, água que sós os deuses bebem! Quem sabe estão lá agora! Anda, caminha! - ordenou em voz autoritária. O Louco tinha a impressão que a cada passo o escudo se tornava mais pesado e crescia. Mas não, tolices suas. Se alguma vez... era a fome, a sede a pregarem-lhe partidas. Mas, ah, depois daquela árvores, as coisas melhorariam, iriam ter um manjar, um banquete à sua espera. Seguramente. O Louco olhou para trás para transmitir esta ideia ao canito branco, mas não o viu. Recuou uns passos.
- Que fazes?! É em frente - zagarateou o Ás de Ouros.
O cão branco estava muito para trás, sem sentidos e um coiote aproximava-se do seu amigo inconsciente. Sem pensar duas vezes deitou o escudo de ouro ao chão e correu para o fiel amigo. No último instante arrebatou-o das garras do coiote e fugiu com ele. Ao passar pelo Ás de Ouros viu que se transformara num velho pedaço de chumbo com ar demoníaco e cheiro horrível. Gritava-lhe imprecações e exigia que o levasse às costas de novo senão coisas terríveis iam acontecer.
O Louco desviou-se e correu com o cão desmaiado nos braços. Do outro lado do monte havia um lago onde matou a sede. Com algumas gotas de água despertou o cão branco, que também bebeu. Não havia banquete nem deuses, mas o Louco não se importou e adormeceu rapidamente, segurando o canito branco contra o peito.
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